13 novembro 2009

Com o tempo...

Poeta levantava-se todos os dias disposto a desmontar a Máquina do Mundo. Lutava com ela enquanto havia luz, às vezes nem parava para comer -um simples descuido e seria engolido, o que, aliás, aconteceu muitas vezes. À noite costumavam descansar e preparar estratégias para a refrega que continuaria, incansável, no dia seguinte. Digo costumavam porque a Máquina do Mundo empenhava-se na disputa, sabia que poderia ser desmontada definitivamente e resistia. Mais: sem a luta de Poeta, não via sentido em existir, era uma máquina inútil e dispendiosa. Mas ele não sabia que sabia disso, apenas lutava e, nas raríssimas vezes que vencia, voltava para casa triunfante, convidava os amigos e tomava uma taça de vinho para comemorar.
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Com o tempo, foram cansando. Nos dias de luta, param para almoçar -e às vezes o fazem juntos, conversando sobre a vida. Terminam cedo, aos sábados.
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Poeta passa agora muitos dias em casa, cuidando das plantas e escrevendo um livro, um longo e minucioso inventário de estratégias para desmontar a Máquina do Mundo.
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Ela também já não se empenha tanto em manter-se funcionando. Tem dias que fica por aí, totalmente destrambelhada. O mundo, por isso, está cada dia mais cheio de falhas e desastres. Mas em alguns dias surpreendentes é invadido por enormes e súbitas ondas de poesia.

8 comentários:

Unknown disse...

ÉÉÉ...derrepente...pode até ser.

Plínia Campos disse...

A poesia só dá a ilusão de que é possível compartilhar o subjetivo. Eu queria te contar dos meus silêncios, dessa pausa ao ler seu texto. Muito bom, poeta.

Dinah Hoisel disse...

Ganhei "de presente" de uma amiga a sua crônica de hoje...Apaixonei! Pela crônica, claro!!!!!
Vou sentar na primeira fila.
Não costumo entrar em blogs, embora tenha um...Imagine! DE POESIA !!!...
Que louca!!!!!
Farei toda a viagem de volta nos seus escritos, até ao primeiro!
Ler na rede????!!!!É tudo que eu gosto, mesmo que tendo uma, eu a uso de maneira imaginária (a maioria das vezes).

Caso queira pode me encontrar no

vamoscirandar.blogspot.com

Será um prazer contactar.

Um abraço, Dinah Hoisel

luHelena disse...

Ultimamente seus textos são surpreendentes - irretocáveis. Nos invadem de súbita e belas ondas de poesia... em pequeninas crônicas.
Abs.,
lu

Sílvio Francisco Lima Margarido disse...

ih......poetas são os relojoeiros que, ao invés de desmontar, fazem essa máquina funcionar.

Ana Regina disse...

Poetas...
poesia e vida
sim e não
muito talvez e
as vezes nenhum controle da inspiração

Os poetas gostam de brincar
com as máquinas ...
com o tempo...
com o vento...
com as palavras!

Vida longa aos poetas!
A vida merece!

Alma Acreana disse...

Caro Toinho,

permita-me elogiá-lo, (sem rasgação de seda), que sua escrita é uma das melhores do Acre, ainda mais por essa 'tonalidade' poética de olhar e expressar o mundo.

Um forte abraço!

luHelena disse...

Antonio,
Sabe que gostei de a máquina do mundo ser desmontada por poetas.
Com certeza a poética da vida emergeria a cada instante sem nenhum tempo - em tempo algum. O tempo todo. Entre tantos. Ah! "que maravilha viver..."
beijos,
lu