Confesso que fico irritado com essa pressa dos jornais e jornalistas acreanos em aderir ao tal acordo ortográfico. Agora, onde se pode colocar "do Acre" eles substituem por "acriano", para demonstrar sua alegre rendição às novas regras. Fiquei ainda mais chateado quando vi releases da Agência de Notícias do governo estadual usando tal aberrante palavra. E agora, pra completar, um supermercado que tinha por slogan "orgulho de ser acreano" já declara, em suas propagandas, orgulho de escrever como os colonizadores e colonizados d'além mar.
Todo mundo sabe que isso é golpe da indústria do livro, qualquer um é capaz de imaginar o tamanho da bolada que o governo vai gastar, nos próximos anos, republicando todo o material didático, do primeiro ano à universidade. Uma mina de ouro. Necessidade mesmo, não existe. Ninguém deixa de entender um romance do Saramago por alguma palavra grafada sem hífen, subumano ou coisa semelhante, assim como não é preciso traduzir Guimarães Rosa para que os portugueses o entendam e apreciem.
Eu havia decidido ignorar essa reforma idiota. Como escritor, não necessito dela: uso meu idioma, aquele que aprendi de meu povo e que vou aperfeiçoando e adaptando às minhas preferências. É um lindo idioma, com origens diversas: no português antigo, no nheengatu, nas influências de diversas imigrações, nos sucessivos colonialismos culturais, na criativa reação popular, na antropofagia dos modernos, na contribuição regional de panos e aruaks... o que faltar, vou inventando.
As regras são simples. Sei que aqui cabe uma vírgula mas por estilo não coloco. Onde não cabe, entretanto, coloco, por prudência e para facilitar o entendimento. Devo ter usado o trema duas ou três vezes na minha vida. Logo percebi sua inutilidade e não preciso que me venham agora, tantas décadas depois, dizer que posso escrever tranquilo sem colocar aqueles dois pontinhos tão apreciados por alemães e noruegueses.
A liberdade que tenho corresponde a uma grande tolerância para com os erros alheios. Se deixo de seguir as regras que conheço mas não aceito, não fico espezinhando aqueles que não seguem por ignorância. Não sou revisor do mundo e, embora pense que os comunicadores devam escrever com um razoável grau de correção em respeito ao senso comum, defendo a idéia, já expressa por um famoso escritor antes que eu nascesse, de que a crase não foi feita para humilhar ninguém. Aliás, o erro pode estar -e frequentemente está- a serviço da evolução da língua e do alargamento de sua abrangência. Tendo a achar tudo interessante mas, francamente, uma reforma que faz com que tantos escribas passem a se autodenominar "acrianos" é uma lástima.
Nasci no Acre, vou morrer acreano.
Todo mundo sabe que isso é golpe da indústria do livro, qualquer um é capaz de imaginar o tamanho da bolada que o governo vai gastar, nos próximos anos, republicando todo o material didático, do primeiro ano à universidade. Uma mina de ouro. Necessidade mesmo, não existe. Ninguém deixa de entender um romance do Saramago por alguma palavra grafada sem hífen, subumano ou coisa semelhante, assim como não é preciso traduzir Guimarães Rosa para que os portugueses o entendam e apreciem.
Eu havia decidido ignorar essa reforma idiota. Como escritor, não necessito dela: uso meu idioma, aquele que aprendi de meu povo e que vou aperfeiçoando e adaptando às minhas preferências. É um lindo idioma, com origens diversas: no português antigo, no nheengatu, nas influências de diversas imigrações, nos sucessivos colonialismos culturais, na criativa reação popular, na antropofagia dos modernos, na contribuição regional de panos e aruaks... o que faltar, vou inventando.
As regras são simples. Sei que aqui cabe uma vírgula mas por estilo não coloco. Onde não cabe, entretanto, coloco, por prudência e para facilitar o entendimento. Devo ter usado o trema duas ou três vezes na minha vida. Logo percebi sua inutilidade e não preciso que me venham agora, tantas décadas depois, dizer que posso escrever tranquilo sem colocar aqueles dois pontinhos tão apreciados por alemães e noruegueses.
A liberdade que tenho corresponde a uma grande tolerância para com os erros alheios. Se deixo de seguir as regras que conheço mas não aceito, não fico espezinhando aqueles que não seguem por ignorância. Não sou revisor do mundo e, embora pense que os comunicadores devam escrever com um razoável grau de correção em respeito ao senso comum, defendo a idéia, já expressa por um famoso escritor antes que eu nascesse, de que a crase não foi feita para humilhar ninguém. Aliás, o erro pode estar -e frequentemente está- a serviço da evolução da língua e do alargamento de sua abrangência. Tendo a achar tudo interessante mas, francamente, uma reforma que faz com que tantos escribas passem a se autodenominar "acrianos" é uma lástima.
Nasci no Acre, vou morrer acreano.
15 comentários:
Toinho, aproveitando o barco literário, aproveito para agradecer pelo livro Nem água, nem lua. Prometo que vou ler em uma semana. Sei que estás sem tempo algum, mas retribui a gentileza agradecendo-lhe publicamente em meu blog. jcarioca.blogspot.com se puderes dar uma passadinha lá. Aproveita e dar aquele lembrete no Carioca. Abraços.
Também sou acreano!
Aderi ao movimento
(o Elson também)!
Muito bem, Toinho! Também sou acreano e morrerei acreano. Agora que estamos de acordo nesse ponto, vamos ao outro: Quando você vai começar a campanha para voltarmos ao nosso velho e querido horário, o horário verdadeiro de todos acreanos?
Oi Toinho, por pura e completa ignorância, alguém que nasceu em Rio Branco pode vir a morrer riobranquino?
Sim, se além de ser riobranquense torcer pelo Rio Branco Footbal Club. Eu, que sou de Barléia e atreticano, não corro esse risco.
Toinho, concordo com você que estas novas regras pra nossa língua são desnecessárias e apenas mercadológicas. A variação de qualquer língua acontece no decorrer do tempo e devido vários fatores. Foi isso que fez com que a Língua Portuguesa variasse de lugar pra lugar. Nisso também está a riqueza cultural de cada povo. Repito, mudanças ocorrem, mas naturalmente. Variação linguística na canetada é, além de tudo, desrespeito às diferenças e um ato de força. Que mal faz um trema, por exemplo? E um acento diferencial e um acento num ditongo aberto? A discussão é válida!
Eu tb sou acreana, e essa coisa toda me irrita profundamente.
Oi Toinho,
Sei lá de onde apareceu essa regra do acrIano. Uma das premissas da malfadada reforma ortográfica era respeitar a lingua falada. Por isso que os portugueses continuarão escrevendo súdiCto, aMnistia e antÓnio.
Ninguém pronuncia acrIano, mas sim acrEano, portanto não haveria o que mudar.
Como tenho inteiros quatro anos para me adaptar (embora a cavalo velho não se ensina truque novo), esperarei escrevendo meu português pré-arcaico de sempre até lá... E depois, acho que passarei a escrever errado mesmo...
Querido: continuo sendo luciacreana, também aderi ao movimento junto contigo, com o Elson e o Marcos Afonso... Como soa mal acriano... Horrível! Vocês não são filhos diretos do Acri. Confesso que não entendi muita coisa dessa reforma ortográfica passando por cima da riqueza das diferenças de expressões e de escrita dos diversos países de língua portuguesa. Para variar vivemos um mundo do pensamento único, da única escrita - da lógica da homegenização. Mas, sempre há brechas para reiventar. Escreveremos como quisermos. PT. Saudações.
Olá Toinho...
Concordo com vc e tambem sou acreana... riobranquense e JUVENTUS...
E...se o Acre tivesse mesmo seguido seu rumo original e se chamasse Aquiry? Hein?
abraços
Ana
Estou como minhas manias em crise. Não gosto de ver nada fora do lugar. Tenho mania de consertar. Agora já não sei mais onde conserto. Ou será concertu?
Olá! Uma amiga me indicou seu blog e vim conferir, enquanto estava lendo seu post pra saber se eu, com voce, ficaria com acordo, meu veio uma idéia... mas não vai dar pra falar não, ela ficou ultrapassada, me deram uma outra novinha, uma ideia... é, essa ideia não foi uma boa idéia, não hoje.
Abraços, meus.
Já disseram que tem um tempão pra gente se adaptar. Vou enrolar esses caras até lá pra ver o que acontece.
Ah! Toinho..
Quando lembro que mamãe falava que você aos dois anos falava liquidificador(com trema, rsss )
Aos quatro já sabia ler e escrever, aprendendo em casa!
Me sentia humilhada! Mas na verdade, feliz, por ser tua irmã e aprender contigo.
Coisinha burra, só aprendi a ler aos sete! Mas falar...
Fico me sentindo estranha com esse papo de Acriano, parece coisa de gente moderna dizendo que saiu na frente.
Daí eu te pergunto, é chateado que você está ou chatiado? Confesso que continuo burrinha e ainda não entendi a nova regra, mas vou continuar chateada com esse papo de ser Acriana. Quando me perguntarem a Naturalidade, vou tascar:
-Acreana!
Ainda tenho tempo algum para aprender as regras.
Mas hoje, 13/03, queria mesmo era te mandar uma poesia, sabes porque.
A música você posta, espero...
Te amo, bjos.
Clarice
Caetano Veloso
Composição: Capinan / Caetano Veloso
Há muita gente
Apagada pelo tempo
Nos papéis desta lembrança
Que tão pouco me ficou
Igrejas brancas
Luas claras na varandas
Jardins de sonho e cirandas
Foguetes claros no ar
Que mistério tem Clarice
Que mistério tem Clarice
Pra guardar-se assim tão firme, no coração
Clarice era morena
Como as manhãs são morenas
Era pequena no jeito
De não ser quase ninguém
Andou conosco caminhos
De frutas e passarinhos
Mas jamais quis se despir
Entre os meninos e os peixes
Entre os meninos e os peixes
Entre os meninos e os peixes
Do rio, do rio
Que mistério tem Clarice
Que mistério tem Clarice
Pra guardar-se assim tão firme, no coração
Tinha receio do frio
Medo de assombração
Um corpo que não mostrava
Feito de adivinhações
Os botões sempre fechados
Clarice tinha o recato
De convento e procissão
Eu pergunto o mistério
Que mistério tem Clarice
Pra guardar-se assim tão firme, no coração
Soldado fez continência
O coronel reverência
O padre fez penitência
Três novenas e uma trezena
Mas Clarice
Era a inocência
Nunca mostrou-se a ninguém
Fez-se modelo das lendas
Fez-se modelo das lendas
Das lendas que nos contaram as avós
Que mistério tem Clarice
Que mistério tem Clarice
Pra guardar-se assim tão firme, no coração
Tem que um dia
Amanhecia e Clarice
Assistiu minha partida
Chorando pediu lembranças
E vendo o barco se afastar de Amaralina
Desesperadamente linda, soluçando e lentamente
E lentamente despiu o corpo moreno
E entre todos os presentes
Até que seu amor sumisse
Permaneceu no adeus chorando e nua
Para que a tivesse toda
Todo o tempo que existisse
Que mistério tem Clarice
Que mistério tem Clarice
Pra guardar-se assim tão firme, no coração
Oi Toinho, lì un dia nas noticias do governo, esta historia di acriano e fiquei muito triste comigo porque pensei que o meu portugues esta muito ruim que nao me lembrava mais come se escrevia. Passei un periodo sem tempo para entrar na internet e agora que descobri a discussao estou contente: posso nao saber mais escrever e falar bem o portugues (26 anos sao muitos) mais estou contenta em "descobrir" que sou ACREANA.
Abraços
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